Questão ambiental

'Não vai ser a postura de um ou outro político que vai definir as ações do Ibama'

Superintendente do Ibama, no Amazonas, afirma que as ações do órgão serão pautadas pela legislação ambiental e não por pressões políticas

Waldick Júnior
waldick@acritica.com
27/05/2023 às 08:37.
Atualizado em 27/05/2023 às 09:19

O geógrafo Joel Araújo, servidor de carreira do Ibama, ocupava interinamente a chefia no órgão no Amazonas até essa semana, quando foi nomeado superintendente (Foto: Jeiza Russo)

Em meio a pressões contra o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por ações em nível nacional e estadual, o superintendente do órgão no Amazonas, Joel Araújo, afirmou para A CRÍTICA que interferências políticas não afetarão as decisões do Instituto.

Ele ocupava a superintendência do órgão desde janeiro neste ano como substituto, mas foi nomeado em definitivo nesta semana. No período, tem protagonizado ações que incomodaram políticos amazonenses, como o caso da capivara Filó e a série de operações contra criação de gado em áreas desmatadas no Sul do Amazonas. 

O cenário lembra em alguma medida o que vem sendo enfrentado há algumas semanas pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que defendeu a posição do Ibama de negar uma licença prévia para a Petrobras procurar petróleo na foz do Rio Amazonas, no Amapá. 

“Aquilo que é melhor para o meio ambiente vai ser a posição do Ibama. É óbvio que existe um contexto maior, que é o bem-estar da sociedade como um todo. Isso também é vislumbrado nas decisões, mas não vai ser a postura de um ou outro político que vai definir as ações do Ibama”, afirma Joel.

Capivara Filó

Ele citou como exemplo o caso da capivara Filó. No dia 18 de abril, o Ibama notificou e multou em R$ 17 mil o influenciador digital Agenor Tupinambá, de Autazes (AM). O caso gerou repercussão nacional e a deputada estadual Joana Darc (UB), que tem a causa animal como bandeira política, atuou para reverter a decisão do Ibama. Ela conseguiu uma liminar na Justiça do Amazonas e o bicho foi devolvido ao amazonense. 

“No caso da capivara Filó, em nenhum momento nós titubeamos em relação a nossa posição frente às obrigações legais. Aconteceu tudo o que aconteceu, houve decisão judicial, mas nossa posição foi perfeitamente baseada na legislação”, defende o superintendente. 

A devolução do animal ao Agenor chegou a ser transmitida ao vivo para mais de 60 mil pessoas pelo perfil no Instagram da deputada estadual. Na ocasião, ela alegou que o órgão estava oferecendo dificuldades para entregar a capivara e chegou a invadir uma área de triagem e tentar abrir a jaula à força, além de partir para cima de funcionários terceirizados. Após críticas e uma nota de repúdio do Ibama, pediu desculpas pela atitude.

Sul do Amazonas

Outra ação do Ibama que chegou a mobilizar até o governador Wilson Lima (UB) foi a série de operações no Sul do Amazonas. No início de abril, o órgão notificou fazendeiros para retirarem cabeças de gado em áreas embargadas pela União. Se os animais não fossem transferidos para áreas legais, poderiam ser apreendidos.

Após as notificações, os fazendeiros procuraram os prefeitos dos municípios que, por sua vez, acionaram a bancada de parlamentares do Amazonas no Congresso Nacional. Os políticos acabaram indo a Brasília para uma reunião com o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho.  

De acordo com Joel, as fases da operação continuarão acontecendo. A ação tem abrangência regional, com braços nos estados de Rondônia e Pará. “Importante ressaltar que nenhum gado foi apreendido até o momento”, diz o superintendente.

“O momento pelo qual a operação passa é de muita liminar [na Justiça], muito pedido de revisão da decisão de apreensão do gado e muitos juízes tem dado a favor dos proprietários, mas a Procuradoria Federal do Ibama faz seus recursos e já começaram a aparecer as primeiras vitorias do Ibama”, pontua.

Licença para BR-319

Na avaliação do superintendente do Ibama no Amazonas, Joel Araújo, a licença prévia para repavimentação da BR-319, emitida às vésperas da eleição do ano passado, tem grandes chances de ser cancelada. O documento ainda está vigente, mas a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já disse que a autorização será ‘revisitada’. 

“As chances de ela ser cancelada são grandes, porque a licença foi emitida de forma desrespeitosa em relação às condicionantes da própria licença. Para quem conhece o processo licitatório é assim: você recebe uma licença de instalação prévia, mas tem uma série de condicionantes e você precisa fazer isso”, comenta Joel.

Uma reportagem publicada pelo site O Eco mostrou que foram apresentadas dez condicionantes no relatório de pedido para a licença. Dentre elas, a elaboração de um plano de desenvolvimento e regularização fundiária ao longo da rodovia, e criação de vagas e autorização de concursos para agentes que atuariam contra crimes ambientais na região.
De acordo com o superintendente, a avaliação sobre o cancelamento ou permanência da licença será feita na sede do órgão em Brasília (DF).

Comentário

Marilene Corrêa, socióloga e  coordenadora  do laboratório de estudos geopolíticos da amazônia legal:  

 "As contradições vão ficar mais evidentes nesse novo momento, porque os projetos de sociedade não são lineares. Ou seja, o governo tem um projeto de sociedade e tem um ministério que quer proteger o meio ambiente, mas essa pasta vai ter que fazer contornos para atingir seu objetivo. 
Por outro lado, estão os políticos, as pessoas que lidam com outras pessoas, lidam diretamente com interesses. E esses interesses nem sempre são do Estado, mas de grupos, não coletivos. Então, essas contradições vão aparecer e talvez até se acirrar por determinado momento até que o Estado pactue uma relação necessária que nem prejudique o conjunto coletivo, não comprometa o futuro do meio ambiente, e nem comprometa também projetos mais próximos, por exemplo, de famílias que precisam sobreviver, de pessoas que não têm ocupação, de produção de uma subsistência imediata. Essas questões todas têm que ser resolvidas politicamente".

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