Aluna é prejudicada por falta de acessibilidade durante prova do Enem
É uma prova feita para não deficientes e eu comprovei isso com essa experiência, no mínimo, humilhante”, disse a candidata de 17 anos com baixa visão que não teve cartão-resposta adaptado e nem auxílio para o preenche-lo.
Annabelle Martins Morato é uma jovem de 17 anos que possui o sonho de ingressar no curso de Desing Gráfico em uma universidade. Sonho este que sofreu uma interrupção inesperada quando a estudante, diagnosticada com glaucoma congênito desde que nasceu, deparou-se com problemas de acessibilidade a pessoas com deficiência (PCDs) na realização da primeira prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no último domingo, que a levaram a eliminação imediata.
A finalista da escola estadual Sant’Ana faz parte de um grupo chamado “baixa visão”, que consiste em pessoas que não são totalmente cegas ,mas possuem de 5% a 30% da visão em seu melhor olho, mesmo após intervenções cirúrgicas ou uso de óculos comuns. Annabelle tem apenas a visão em um dos seus olhos e o mesmo se encontra com menos de 20% de visibilidade. Por isso, o tipo de avaliação entregue para esse grupo é ampliada, ou seja, possui fonte tamanho 24 e imagens grandes na impressão.
A estudante, que realizou a primeira prova em um colégio particular da Zona Centro-Oeste de Manaus, relatou que toda a prova estava em fontes maiores, menos o gabarito, que é única maneira de correção válida do exame. “Eu já tinha feito a prova do (Processo Seletivo) Macro, da Ufam, dias antes, e lá aconteceu a mesma coisa. Felizmente, consegui solicitar alguém para transcrever as respostas para mim. Por isso, quando cheguei no Enem, tentei saber sobre a acessibilidade, mas ninguém sabia me informar. Fiquei desesperada e, quando recebi a prova e vi que de fato não era ampliado, falaram que ninguém poderia me ajudar já que não solicitei auxilio na hora da inscrição”, afirmou.
O outro lado
Procurado pela reportagem, o Ministério da Educação (MEC) não se manifestou sobre o caso, informando apenas que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (Inep) deveria responder os questionamentos, uma vez que é o órgão responsável pelo exame.
O Inep, por sua vez, informou que os participantes do Enem com problemas oculares podem, sim, realizar as provas modificadas, mas que “o cartão-resposta não é ampliado”. “Caso o participante necessite de auxílio para seu preenchimento, deve solicitar também o ‘auxílio para transcrição’”, informou.
Caso vai à justiça
Annabelle afirma que ao solicitar a prova ampliada o site não informa que o cartão –resposta não vem ampliado e que, por razões lógicas, não precisaria de alguém para responder algo que ela teria condições de realizar sozinha.
“Eu fiquei totalmente desacreditada e sem chão, mas a gestora e os fiscais me pressionaram a fazer a prova, inclusive dizendo que podiam me ajudar na hora do gabarito. Eu fiz a prova durante seis horas, eu usando o tempo extra e forçando a minha visão, para no final ouvir ‘ninguém pode transcrever pra você’”, lamentou a jovem.
Segundo ela, os fiscais a orientavam a “forçar mais a visão” para não ser eliminada. Chegou a usar até lupa para visualizar melhor, mas sofreu muito como desgaste físico e mental, se sentindo pressionada pelos fiscais. “Sinto que fui excluída e esquecida, como em várias outras provas de escola, vestibulares, etc. Falta acessibilidade. Vi os meus sonhos sendo tirados de mim. É uma prova feita para não deficientes e eu comprovei isso com essa experiência, no mínimo, humilhante” disse Annabelle.
A representante judicial da estudante, a advogada Joyce Lima, entrou com um mandado de segurança ontem na 1ª Vara Cível da Justiça Federal, solicitando que o Inep elabore outra prova devidamente adaptada para que Annabelle possa tentar novamente ingressar em seu sonho.