Entrevista

Orgulho, preconceito e a receita para o sucesso

Visionário, o designer Paulo Tenório, CEO da Trakto Design, plataforma com mais de um milhão de usuários, enfrentou preconceito por ser nordestino, mas não se curvou aos grandes centros de negócios

Luana Carvalho
luanacarvalho@acritica.com
13/12/2022 às 13:27.
Atualizado em 13/12/2022 às 13:34

Paulo Tenório pretende realizar uma edição da Trakto Show em Manaus (Trakto Design/divulgação)

PENEDO (AL) - De Arapiraca, no interior de Alagoas, o empresário Paulo Tenório, 41, teve a ideia de construir uma plataforma pela qual pudesse ajudar empreendedores a criarem seus materiais de marketing e ajudá-los a se comunicarem de forma mais fácil no mundo digital. CEO da Trakto Design, concorrente do Canvas na América Latina e que hoje possui mais de 1 milhão de usuários, ele enfrentou preconceito por ser nordestino, o que o impulsionou a buscar, cada vez mais, descentralizar o olhar dos grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro, focando seus projetos nas regiões Norte e Nordeste.

Durante a 7ª edição da Trakto Show, um festival de empreendedorismo, inovação, marketing e negócios que aconteceu em Penedo, cidade histórica de Alagoas, Paulo conversou com A CRÍTICA e relembrou o início de sua trajetória. Também revelou planos futuros, como o de sediar o evento em Manaus, capital do Amazonas, em 2023. Confira a entrevista:

Como surgiu a ideia de criar uma plataforma de edição voltada para negócios?

Eu havia morado em São Paulo e em vários outros estados do Brasil quando recebi a proposta para sair do País e ir para os Estados Unidos. Trabalhei em Nova York e finalmente recebi uma proposta de trabalhar em Los Angeles, em Hollywood. Em 2010, recebi uma ligação de que meu pai estava mal de saúde. Voltei para o Brasil no ano seguinte e logo depois meu pai faleceu.

Eu já tinha uma ideia na cabeça e ficava pensando como eu poderia tirar esse projeto do papel. O objetivo era ajudar outros empreendedores que chegavam comigo e falavam: “Paulo, faz um cartão de visita pra mim?”. Eu trabalhava para algumas multinacionais e não tinha tempo de fazer esses pequenos trabalhos.

Então começamos com uma calculadora, que calculava as horas de trabalho e enviava propostas comerciais de forma automatizada aos clientes. Como todo negócio, o começo não foi o que a empresa é hoje em dia. Participarmos do Demode, um evento patrocinado pelo estado de Alagoas, onde a Trakto competiu com 40 projetos e ficou em primeiro lugar.

Paulo durante a Trakto Show, em Alagoas (Divulgação)

E como foi para a Trakto se transformar na plataforma que é hoje?

Eu não sabia o que era uma startup, vim do zero e decidi fazer valer. Eu estava acostumado a trabalhar como profissional criativo. Passamos por vários processos de aceleração até que participamos da primeira rodada de investimentos em 2015 e aí sim a Trakto nasceu como uma empresa sólida e começamos a jornada com a plataforma que temos hoje em dia.

A ideia inicial, mesmo tendo começado com a calculadora, era identificar como podíamos ajudar o empreendedor a criar seu material de marketing. Nessa época o WhatsApp não era o que era hoje, e nem o Instagram.

Ter participado da rodada de investimentos foi a virada de chave da Trakto? Os investimentos são suficientes?

Mencionamos o Canvas como concorrente, mas há diferenças brutais. A Trakto levantou até hoje pouco mais de R$ 10 milhões de reais de investimentos, que dá menos de US$ 3 milhões. O Canvas, com um PowerPoint só, sem produto, levantou US$ 3 milhões, sendo que 1 milhão e meio de dólares veio do governo australiano, de fundo perdido a outra metade veio de investidores. E para colocar o produto no mercado, eles conseguiram levantar US$ 20 milhões.

Quem conhece a jornada de desenvolvimento de um software sabe que, quando a gente compara com o Canvas, é uma diferença brutal de investimento. Mas estamos brigando com os melhores do mundo! E dá para brigar de onde estivermos.

Paulo durante a Trakto Show, em Alagoas (Trakto Design/divulgação)

De onde estiver mesmo, já que você não saiu de Alagoas e realiza a Trakto Show no teu Estado…

Isso. E o evento (Trakto Show) é uma das formas que a gente mostra esse propósito. A gente pega um empreendedor que está nascendo e fala: “Olha, posso te ajudar?”. E aí a gente oferece as ferramentas de design da Trakto, criação automatizada, o editor...

E também tem a parte da educação. Tem muito profissional que precisa se comunicar. Minha esposa é dentista e é um desafio para ela porque ela não é uma pessoa da área criativa de design. Então a ferramenta vai capacitando.

A maioria não sabe como dar o primeiro passo e o evento traz especialistas sensacionais do mercado, histórias de inspiração, que ajudam os empreendedores nestes negócios, desde os que estão começando aos profissionais que precisam se reinventar.

No evento pode surgir uma sociedade. Um empreendedor vê a ideia do outro, copia para o bem em outro Estado. A ideia é despertar essa fagulha. Inspirar....

E quais são teus planos de expansão da Trakto?

A mecânica é ir pra locais onde há uma carência de oportunidades. A gente faz uma coisa importante: apesar de estar em Maceió, eu nasci em Arapiraca, interior de Alagoas, não tenho bairrismo. Eu acredito muito que quando a gente descentraliza o olhar de São Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro, a gente consegue trazer uma coisa positiva para gente.

Infelizmente, não temos investidores em Alagoas. O que eu tive que fazer? Ir para São Paulo captar. E quando fui, tive que passar pelo filtro: eu nordestino, muitas vezes escutei que eu tinha que morar lá.

Então achar investidores fora dos grandes centros foi uma coisa que busquei muito. Conseguimos, por exemplo, a Mene&Portela em Manaus, que vieram através de um fundo de investimento que é a Bossa. A ideia de levar a Trakto para estados e municípios fora deste eixo faz com que a gente construa algo novo ao invés de tentar repetir a mesma fórmula de sucesso de quem se muda pra São Paulo.

Você falou sobre um filtro. Então foram muitos episódios de preconceito que você enfrentou?

O evento (Trakto Show) nasceu de um fato muito triste que me ocorreu. Eu estava no Google Camps, na aceleração, dentro do prédio do Google em São Paulo quando um investidor viu o portfólio da Trakto e mandou uma mensagem pra gente se encontrar.

Marcamos numa padoca, e chega o investidor com características bem paulista, mauricinho, bem "Faria Limer". E ele já foi falando do meu sotaque, meu cabelo, minha aparência, uma conversa bem babaca no começo, que a gente costuma chamar de de small talk (conversa fiada). Ele foi perguntando sobre o clima, se era muito quente no Nordeste…

Esse cara foi tão babaca que eu voltei para o escritório, bem chateado, resolvi que eu não ia sair do meu Estado e mais: levaria os paulistas para o Nordeste, porque eu estava cansado de ser destratado. Morei nos Estados Unidos muito tempo, muitos deles não tinham metade de experiência que eh. E foi com essa raiva que eu construí o evento.

Você conseguiu furar essa bolha. Foi difícil mesmo com a maioria dos investidores sendo de São Paulo?

Apesar da desgraça, a pandemia foi, em termos de negócio, uma oportunidade de abrir os horizontes para a Trakto. Eu era mais uma cabecinha no Zoom, no Meet, e eu não precisava mais estar em São Paulo porque não podia mais se encontrar pessoalmente por conta das restrições. E aí quebrarmos o argumento deles. Isso fez com que levantasse uma rodada de investimentos para a gente, que incluiu Manaus.

Vocês possuem, inclusive, um escritório em Manaus há três anos. Quando irão levar o evento para lá?

Brevemente. Manaus está em nossos planos. Muitas pessoas não fazem ideia do que é aquele lugar. Manaus e Maceió (capital de Alagoas) têm uma coisa parecida, não são consideradas grandes centros, mas têm muitas oportunidades. Em Manaus principalmente, em relação à tecnologia, com a Lei da Informática, acaba-se tendo muito recurso para investimento oriundos da indústria e esses recursos precisam ser acessados para P&D (pesquisa e desenvolvimento).

A ideia é que Manaus lidere essa transformação na Amazônia e por isso queremos fazer um evento mais internacional, já que de Manaus para Miami (EUA) é um pulo. Estamos conversando com investidores e alguns representantes poder público para fazer esse projeto sair do papel.
 

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