Rodemarck Castelo Branco diz que aumento do petróleo é por conta da guerra, mas o corte do imposto é permanente e sem transição. Segundo ele, a medida teria que ser bem estudada e com regras de transição
Economista Rodemarck Castelo Branco disse que o vale-diesel é uma medida eleitoreira que não terá grande impacto no problema (Foto: Arquivo Pessoal)
“Um tiro no pé”. Essa é a avaliação do economista e consultor Rodemarck Castello Branco sobre o Projeto de Lei Complementar nº 18/22 que criou um teto de 17% a 18% para a alíquota do ICMS, imposto que gera arrecadação para aplicação de recursos na saúde e educação dos estados. O PLP foi sancionado na quinta-feira pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), que vetou trechos da proposta que concediam compensação aos estados pelas perdas na arrecadação.
“Precisamos nos perguntar se medidas como essa estão levando em conta a Lei de Responsabilidade Fiscal, até porque os governos estaduais e municípios estavam contando com o dinheiro que vem a partir desse imposto. Como é que se reduz assim, sem qualquer plano gradual de aplicação dessa mudança?”, questiona Castello Branco, que também é ex-secretário municipal de Economia e Finanças.
O texto aprovado no Congresso Nacional previa que a União compensasse os estados que não alcançassem os gastos mínimos constitucionais em educação e saúde em decorrência de perdas fiscais. Porém, Bolsonaro vetou essa proposta. Para o governo, “a proposição criaria compensações para a União e despesas para os Estados e Municípios que poderiam ampliar possíveis desequilíbrios financeiros”.
Além disso, o PLP previa que o governo federal compensasse os cinco estados sem dívidas com a União através de recursos da compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), o que também foi vetado. Agora, deverão receber uma “ajuda” apenas estados que tiverem perdas fiscais acima de 5% em comparação a 2021. Para isso, receberão um abatimento das dívidas com a União, mas a compensação só vale até o fim do ano.
“O governo, com certeza, está buscando a solução errada para o problema. Se a alta dos combustíveis está ligada a uma crise internacional no preço do barril do petróleo, à guerra na Ucrânia, é preciso que a intervenção nessa situação seja também momentânea. Como é que se torna permanente a redução do ICMS, repito, sem uma transição, em um contexto que pode mudar já no ano que vem?”, pontua o especialista.
Castello Branco diz ser a favor da redução do imposto estadual sobre os combustíveis. “No Rio de Janeiro, por exemplo, que é de 32%, é um crime”. Porém, o economista defende que uma eventual diminuição dos tributos deve ser amplamente estudada e pensada a longo prazo, com regras de transição bem definidas.
O preço dos combustíveis é uma das pedras no caminho para a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Porém, reduzir o ICMS e consequentemente baixar o preço dos combustíveis – embora isso não impeça novos aumentos pela Petrobras – é visto de maneira negativa por alguns economistas, como Denise Kassama, que também é conselheira suplente do Conselho Regional de Economia do Amazonas (Corecon-AM).
“Todas essas ações que o governo está tentando vão surtir pouco efeito para o consumidor final. Parecem muito mais manobras com finalidades eleitoreiras, porque são para durar pouco tempo, só para facilitar aí a questão das eleições, mas não efetivamente atacar o problema de fato”, comentou.
Além da alteração no tributo estadual, o governo estuda até mesmo a criação de um vale-diesel para caminhoneiros e a ampliação do vale-gás para cobrir 100% do preço da botija. Ambas as medidas valeriam apenas até o fim do ano. O economista Castello Branco tem opiniões diferentes para cada uma das propostas.
“Esse benefício para o gás de cozinha eu sou a favor, porque é preciso ter atenção à população mais pobre e esse vale é essencial. A discussão, na verdade, deveria ser justamente essa. Nós temos 30 milhões de brasileiros passando fome econtinuamos falando sobre combustíveis”, afirma ele.
Sobre o vale-diesel, que pode chegar até a R$ 1 mil, o economista discorda. “É uma medida completamente eleitoreira para um problema conjuntural deste momento em que estamos. Não vai resolver a questão e não tem grande impacto. Como ficam os outros trabalhadores que também precisam do diesel, como motoristas de transporte particular e coletivo?”, ressalta.
Em números
R$ 1,2 bilhão É a perda de arrecadação anual prevista pela Sefaz-AM). O número foi informado pelo secretário Alex del Giglio, que confirmou as perdas mesmo após a alteração do PLP 18/2022. Somente neste ano, a mudança no ICMS do Amazonas deve retirar R$ 600 milhões do Estado.
Não consigo enxergar uma solução a curto prazo devido à complexidade do problema. Mas a longo prazo, a solução seria tornar a produção da Petrobras mais factível para o mercado nacional, ou seja, investir mais no refino para que a empresa dependa cada vez menos do insumo importado e utilize mais o nacional. Hoje, a gente sabe que a produção de petróleo nacional seria autossuficiente, mas a Petrobras não tem capacidade nem estrutura ou tecnologia para refinar todo o petróleo que produz, principalmente o do pré-sal, que é de uma densidade diferente. Então, havendo investimentos nessa área, a longo prazo você tornaria o país autossuficiente na produção do petróleo e, portanto, menos vulnerável a essa oscilação do mercado internacional.
A crise no preço dos combustíveis é, atualmente, o maior ponto de tensionamento do governo federal. Desde os últimos reajustes na gasolina (5,18%) e no diesel (14,26%), anunciados pela Petrobras no dia 17 de junho, houve uma série de consequências na política.
O presidente da estatal, José Mauro Coelho, pediu demissão; o governo federal falou em propor uma CPI para investigar diretores e conselheiros da empresa; e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, sugeriu alterar a Lei das Estatais, que criou parâmetros para evitar o loteamento de cargos a políticos em empresas públicas.
“Vejo como absurdas essas propostas. O governo federal, que indica o presidente da Petrobras e parte dos conselheiros, que é acionista majoritário da empresa, vai pedir uma CPI para investigar essas mesmas pessoas? Não faz sentido. Pior ainda a ideia de alterar a Lei das Estatais. Fazer isso seria destruir a Petrobras. Um retrocesso imenso. É preciso entender que estamos em outro momento e que todos esses movimentos afetam em muito a empresa”, avalia Rodermack Castello Branco.
Segundo a ANP, nessa semana o diesel e gasolina apresentaram preços recordes. O diesel foi vendido em média a R$ 7,568 por litro. Mais foi encontrado a R$ 8,950 em Cruzeiro do Sul (AC). A gasolina ficou em R$ 7,390, mas em São Paulo chegou a R$ 8,890.
“O Sindipetro Amazonas e a FUP já vêm denunciando há muito tempo que o principal motivo para o aumento dos combustíveis é a política de aumento de preços aplicada pelo governo federal junto com a atual gestão da Petrobras, o chamado PPI – Preço de Paridade Internacional. E isso se agrava ainda mais quando o governo aplica uma política de privatização da empresa, da venda de ativos, onde, dentro desses ativos, se encontram as refinarias, incluindo a Refinaria de Manaus. Caso essa refinaria, que é a única da região Norte, seja vendida, temos a certeza de que os preços dos combustíveis na região Norte, incluindo o Amazonas, irão aumentar de maneira altíssima. Um exemplo é o que acontece na Bahia. Hoje, o povo baiano paga a gasolina mais cara do país porque a refinaria de lá foi privatizada. A tal concorrência não existe, e olha que estamos falando da região Nordeste, onde há outras refinarias. A saída para tudo isso é “abrasileirar” o preço dos combustíveis e para isso é necessário suspender o PPI e a política de venda das refinarias e coloca-las para operar com 100% da capacidade”.