Aproximadamente, 180 gatos e 37 cães abandonados circulam pela instituição
(Foto: Junio Matos)
O abandono de animais domésticos no campus da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) localizado no bairro Coroado, Zona Leste de Manaus, tem sido uma prática recorrente. Aproximadamente, 180 gatos e 37 cães abandonados circulam pela instituição que é uma Área de Proteção Ambiental (APA), ou seja, ambiente de animais silvestres e plantas nativas.
Nesse sentido, que a comunidade acadêmica clama para que a população pare com a prática e chama a atenção das autoridades para que haja fiscalizações severas e puna de fato, quem cometa o crime.
O número de animais abandonados foi levantado pelos próprios alunos e uma ex-aluna que compõe um grupo que desde 2013, tem se dedicado diariamente a cuidar, alimentar, castrar e ainda fazer a adoção responsável dos animais domésticos. Os gastos são dos próprios alunos.
“A gente não é uma organização, não criamos animais aqui dentro, muito pelo ao contrário, as pessoas jogam os animais aqui e a gente dá destinação a eles, ou seja, para adoção. Para conseguir mantê-los é através da ajuda dos amigos, nós fazemos rifa, juntamos um dinheiro, fazendo a cotinha para comprar o saco de ração. Só que tem os imprevistos, mais animais são abandonados e inclusive um cachorro foi atropelado aqui dentro, e sem saber como ia conseguir, o levei ao veterinário”, conta a ex-aluna e graduada em Engenharia de Pesca, Yasmin Lima de Vasconcelos, 24 anos.
O grupo é composto por apenas oito pessoas em um universo de centenas de graduando na Universidade Federal do Amazonas. Eles se revezam em cuidar dos animais que ficam em uma sala do prédio antigo da faculdade, mas cães e gatos circulam livremente pela instituição.
“A gente logo reconhece quando é um animal novo. Aí logo nos preocupamos em castrar. Nós levamos para castrar em um lugar mais em conta, enquanto ele está no processo de pós operatório, a gente já vai tentando a adoção. Quando a gente não consegue, eles ficam soltos pelo campus. Outra situação são os cachorros que são jogados na mata e são crescem ariscos, desses a gente não consegue chegar perto”, acrescentou a jovem.
Os alunos clamam para que a população pare com o abandono de animais domésticos nas dependências da universidade e cobram a reitoria que medidas sejam tomadas. Outros apelos por parte da comunidade que presencia o abandono é para que haja severas fiscalizações por parte dos órgãos ambientais e de proteção aos animais. O pedido também vai à Prefeitura de Manaus, para que realize vacinação e controle antirrábica dos animais domésticos.
“A solução é acabar com o abandono. A gente entra em desespero por que são anos com isso, as pessoas entram aqui e despejam os animais. Ninguém mais tem psicológico para isso. Na semana passada, por exemplo, a gente perdeu três animais por que jogaram aqui um cachorro com cinomose”, destacou ainda.
Questionado sobre qualquer estratégia pensada pelos órgãos municipais, a Prefeitura de Manaus, por meio de nota afirmou que o campus é de responsabilidade da Universidade Federal do Amazonas, à qual cabe o monitoramento dos espaços da Instituição. Já em relação a vacinação antirrábica animal, a Prefeitura afirma que “realiza campanha anualmente com a finalidade de vacinar cães e gatos, sejam eles domésticos ou de rua e o Campus da Ufam está contemplado nas rotas das equipes de vacinação”.
Impactos à fauna
Outra questão discutida são os impactos que os animais domésticos podem causar a fauna silvestre que tem como habitat, a área da universidade. Segundo o professor do departamento de Biologia da Ufam, Marcelo Gordo, cães e gatos predam animais silvestres com frequência, “diminuindo consideravelmente as populações de animais pequenos ao redor das áreas construídas, principalmente esquilos, lagartos e aves”, destacou ele.
Para ele, há solução, porém segundo Marcelo Gordo, as medidas não são muito “simpáticas” aos olhos das pessoas e a legislação atual não ajuda muito. “Mas mesmo tomando qualquer decisão que seja o trabalho será eterno, pois o problema está na falta da cultura de posse responsável por parte dos habitantes de Manaus e falta de uma legislação rigorosa associada a uma fiscalização eficiente. No meio acadêmico, quem realmente estuda o assunto, é consciente de que isso é um problema real”, finalizou ele.
Segundo o professor do Departamento de Ciências Florestais da Faculdade de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Amazonas, Rogério Fonseca, há três tipos de animais no interior da floresta da instituição. Conforme ele, há os cães errantes que são aqueles de propriedade dos moradores do entorno que de maneira irresponsável são soltos na mata e circulam pela a área, os cães asselvajados que são filhos dos cães errantes e não ocupam o território dos seus pais, e o terceiro grupo que são de animais abandonados.
“A partir desses três grupos, o terceiro deles são os mais visíveis. Geralmente, estes circulam próximo dos prédios administrativos, se alimentam de ração, água, ofertado pelos alunos. Contudo, a gente tem que lembrar que estes animais têm o seu extinto, tanto gatos quanto cachorros foram melhorados zootecnicamente ao longo do tempo evolutivo para poder serem ferramentas de caças do homem”, explicou ele, que é doutor em Ecologia Conservação e Manejo de Vida Silvestre.
“A solução para esse grupo é muito simples, é sim realizar a captura desses animais e dar destinação às organizações governamentais da cidade e a gente sabe tem muitas organizações sérias que trabalham com a questão de proteção animal e elas recebem recursos públicos e privados para poder fazer a destinação da melhor forma possível”, acrescentou.
Segundo Rogério Fonseca, a área da UFAM por se tratar de uma unidade de conservação, implica-se várias responsabilidades principalmente ao poder municipal, uma delas é de se elaborar um plano administrativo de manejo pra que possa fazer a melhor salvaguarda do patrimônio.
“Deveria já terem feito o plano administrativo dessa área e aí sim, haveria planejamento de como haver essa retirada desses animais do interior do fragmento florestal da Ufam. Hoje, nós temos instituições públicas que não estão fazendo a gestão disso, há de se saber que o município tem plena e total responsabilidade desse tema, tem poder legal para resolver mas hoje, a gente vê muito mais a inércia institucional dos municípios do Brasil”.
Quanto aos impactos, o técnico destaca que há a questão da predação dos animais silvestres. E relembra quando estes animais circulavam entre os alunos e professores. “Cães comem tamanduás, comem juparás, quatis, ou seja, animais que tem o mesmo tamanho dos cães e como eles tem o comportamento de matilha, eles não atacam sós, atacam sempre em grupo", disse. "A gente caminhava com cutias, tamanduás até 2008 quando havia pouquíssimos animais abandonados. De lá (2008) para cá, aumentou assustadoramente a procriação desses animais no interior da floresta da Ufam”.
Resposta Ufam
Em nota, a assessoria de comunicação da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) afirma reconhecer o abandono de animais domésticos e ressalta que a prática “tornou-se um problema crônico”.
“Da mesma forma que há os profissionais que atuam na preservação dos animais silvestres, há também outros, que cuidam dos animais domésticos como seu fossem seus. No meio disso, a Universidade, que estando dentro da APA, vê a mobilização dos que cuidam dos animais domésticos, se põe numa condição de conciliar e atuar na sensibilização da comunidade, não apenas a universitária, mas a do entorno”.
Conforme comunicado, em outubro de 2017, foi lançamos a campanha 'Desabandone', com informações que orientavam dos danos à APA sobre a permanência dos animais domésticos.
“Além disso, ainda no âmbito institucional, o que temos feito é: buscar membros para compor um Comitê Gestor de forma que este possa atuar frente a esses animais que chegam necessitados de vacinas e cuidados de saúde e também nas campanhas de sensibilização o não abandono desses bichos no campus”.
Segundo a resposta da assessoria, até o final do ano, a campanha será fortalecida e deverá contar com segurança patrimonial do campus e eventualmente, a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM) e seu setor especializado, mais especificamente contra crime de maus tratos.