"Eles querem pintar o chão da UFAM com urucum e jenipapo, querem marcar a presença aqui", destacou a coordenadora do curso. A turma 'Baixo Amazonas' reúne estudantes de diversas etnias de dez municípios do estado
Seminário de acolhimento do curso de formação de professores indígenas foi realizado na manhã de hoje (18), no campus da UFAM, em Manaus (Foto: Daniel Brandão/Freelancer)
A Universidade Federal do Amazonas (UFAM) iniciou o seminário de acolhimento do curso de formação de professores indígenas, nesta segunda-feira (18). Pela primeira vez em 15 anos de existência, a licenciatura vai acontecer em Manaus. A turma 'Baixo Amazonas' reúne estudantes de diversas etnias de dez municípios do estado.
O Curso de Licenciatura de Professores Indígenas 2024 tem 97 estudantes dos municípios de Anamã, Careiro da Várzea, Manacapuru, Itacoatiara, Rio Preto da Eva, Presidente Figueiredo, Novo Airão, Beruri, Manaus e Iranduba. Uma das discentes e também representante da turma é Marlete Cruz, que veio de Manacapuru, e entende que a formação pode diminuir as barreiras para o acesso à educação para os povos originários no interior do Amazonas.
Aluna e representante da turma, Marlete Cruz
O calendário letivo começou nesta segunda-feira e, de acordo com a coordenadora do curso, professora Elenice Ricardo, ele possui dois módulos com 45 dias cada. Ocorrem no início e no fim de cada um dos quatro anos e meio de formação. Além da licenciatura, há também a oferta de especialização.
Apesar de ser gerenciado pelo Departamento de Educação Escolar Indígena, o curso não é institucionalizado pela UFAM, mas faz parte de um convênio junto ao Ministério da Educação, que é o responsável por custear a realização da formação. Os alunos que vieram dos municípios do interior recebem uma bolsa aluguel, mas a universidade também conta com uma parceria com uma ONG (Organização Não Governamental) para acomodar estudantes que ficaram de fora da bolsa.
O curso faz parte de um convênio junto ao Ministério da Educação, que é o responsável por custear a realização da formação
O curso existe desde 2008 e surgiu de uma luta da comunidade indígena de Autazes e de outros municípios da região metropolitana de Manaus. O professor Mário Mura fez parte da primeira turma de formação e também foi um dos principais ativistas para a criação do curso. Ele explicou que foram cerca de dois anos de estudo e captação de apoio para que a licenciatura nascesse.
'Passamos esses anos pesquisando porque havia a necessidade dessa formação. Conseguimos um apoio de uma pesquisa que já era realizada na UFAM sobre esse tema, a educação indígena, e fomos até Brasília onde nos reunimos com o Ministério da Educação e inscrevemos o nosso projeto de curso no edital do governo federal', disse o professor.
Mário Mura, egresso do curso
Já são 15 anos de existência da licenciatura, mas neste ano de 2024, o curso será ministrado pela primeira vez na UFAM em Manaus. A coordenadora Elenice informou que a decisão buscou atender aos pedidos da comunidade indígena de fazer uso da universidade.
'É uma luta deles, o projeto nasceu assim. E esse é um espaço deles por direito. Eles são além de alunos, são ativistas da causa e para gente isso é muito importante', explicou a coordenadora.
Elenice Ricardo é a coordenadora do curso
A representante da turma considera que a abertura das portas da UFAM para os alunos representa a quebra de barreiras e um passo fundamental na luta por políticas públicas que sejam realmente funcionais para a comunidade indígena.
'A universidade muitas das vezes inviabiliza o indígena dentro da instituição, mas estamos aqui para fazer a diferença. Para discutir programas, políticas afirmativas voltadas para os nossos povos. Estamos aqui para gerar essa discussão e transformar a UFAM em um território indígena', disse Marlete Cruz.
O mestre em Antropologia Social e conceituado ativista da causa indígena, Gersem Baniwa, defende que a união da universidade e alunos promove um ganho gigantesco para as ciências humanas e expande os horizontes de pesquisas dentro das culturas das diferentes populações originárias.
Gersem Baniwa, mestre em Antropologia Social e conceituado ativista da causa indígena
'A universidade se torna uma espécie de caldeirão de conhecimentos com equivalência e importância à ciência tradicional. Foram esses conhecimentos que sobreviveram a milhares de anos que permitiram o desenvolvimento de sociedades, de modos de vida. É maravilhoso, é um momento de maturidade da UFAM', disse Baniwa.