Sazonalidade

Preocupação e medo que chegam com a subida do rio Negro

Famílias que moram na comunidade Bairro do Céu relatam momentos de desespero e os problemas que chegam por causa da elevação do rio

Amariles Gama
online@acritica.com
21/05/2022 às 08:36.
Atualizado em 21/05/2022 às 08:56

Paulo Soares Guedes, de 66 anos, mostra a marcação da cheia histórica do ano passado (Phill Limma/Freelancer)

Maio é o mês para a população manauara que vive em áreas atingidas pela cheia começar a se preparar para a subida do rio Negro.

Na comunidade Bairro do Céu, no Centro, uma das mais atingidas pela cheia, as águas estão invadindo as casas. Os moradores começaram a construir as chamadas “marombas” para elevar o assoalho das casas, além de pontes para facilitar o tráfego pela comunidade.

Vale ressaltar que o típico ciclo amazônico da elevação dos rios inicia sempre em meados de novembro para dezembro e segue, geralmente, até junho, quando inicia o verão, com o calor que passa dos 40ºC, na sombra, e vai aumentando conforme o passar dos meses até, novamente, fechar o ciclo e iniciar o inverno.

Paulo Soares Guedes, de 66 anos, é potiguar, nascido em Natal, Rio Grande do Norte, mas vive na localidade há cerca de 20 anos. Ele relata que há um mês a prefeitura concluiu a construção de uma ponte de madeira naquela área para que os moradores possam se locomover durante o período de inundação. Para o morador, a aposta é que a cheia deste ano não ultrapasse o nível da cheia do ano passado.

“Mas tem que tirar esse pessoal daqui. Isso aqui quando alaga, já teve jiboia, uma sucuri que puxou um cachorro, tem jacaré. Por ali quase que uma sucuri pega um homem. Tem muita coisa obscura nessa água. Daqui pra baixo tem 5 a 6 metros. Tem muita sujeira, o pessoal já tirou sacos e sacos de lixo, mas o que eles querem é que tirem eles daqui, indenizem essas pessoas”

, disse Paulo, que muito carismático apresentou a realidade da comunidade.

'Não tem madeira, e é tudo por conta da gente mesmo'

As águas do rio Negro já começaram a invadir também a casa da diarista Alessandra Paiva de Oliveira, de 37 anos, que mora na comunidade Bairro do Céu há dois anos. Sem renda fixa e vivendo de “bicos”, ela relata que já está preocupada pensando como irá conseguir comprar madeira para elevar o piso da casa esse ano e evitar maiores prejuízos.

“Não tem madeira, e é tudo por conta da gente mesmo. Essa noite eu fiquei pensando o que eu vou fazer. Não sei se eu desmonto o guarda-roupa ou pego o beliche da minha filha [pra fazer maromba], são escolhas, né? Só tem esse resto de madeira aí, e a água já tá entrando. Tá cruel”

, relata a moradora.

A situação não é diferente na casa da aposentada Maria Piedade de Oliveira, de 64 anos, onde a água já está a um palmo do assoalho da cozinha dela. Na parede, as marcas da cheia do ano passado ainda são visíveis. Morando no local há quase 50 anos, Maria Piedade conta que todo ano é a mesma situação.

“De noite é bicho, é tanta coisa, rato... Eu já estou pensando como vou fazer essas marombas. Ano passado eu passei uma luta financeira aqui, era jacaré, cobra, lixo, e tudo que não presta. Só eu e Deus pra me livrar. Quase três meses nessa situação”,

 relembra.

Outra moradora da comunidade é Vera Regina Pereira de Souza, de 63 anos, que está doente e esperando por uma cirurgia de retirada do rim que, segundo ela, não vai demorar. O medo dela é ter que se recuperar dessa cirurgia com a casa inundada pela água que não para de subir.

“Não tenho ajuda de nada, estou sem renda. Essa casa aqui onde eu moro é cedida pra mim. Aqui sempre alagou, sempre perdemos as coisas, e a gente está precisando de ajuda, que venha alguém pra cadastrar e tirar a gente daqui. A situação está precária. Eu tenho um auxílio de R$ 150 e a Igreja de Aparecida também me ajuda”, relatou Vera Regina.

Projeto Social

A comunidade Bairro do Céu também abriga pessoas que unem esforços para amenizar o sofrimento do próximo. Pessoas como a assistente de saúde, Francisca Audeniza Teles da Silva, de 69 anos, que participa do projeto ‘Mãezinha do Céu’, coordenado pela terapeuta Elvira França.
 
O projeto já tem mais de 20 anos de trabalhos na comunidade, segundo Audeniza. Durante as datas comemorativas do ano acontecem ações como a entrega de cestas básicas, marmitas com comida, além de acompanhamento com as famílias. Audeniza conta que também participa de atividades promovidas pela Igreja de Aparecida.

“Eu Audeniza me sinto muito bem em ajudar o próximo, é uma missão que eu tenho. Não é que eu queira me eleger em nada, eu me sinto realizada quando eu ajudo o próximo. E eu apelo também para as autoridades máximas, eles sim têm como nos ajudar, as famílias aqui estão precisando muito”, disse.

Alerta de cheia

No dia 29 de abril, o Serviço Geológico do Brasil emitiu a segunda edição do Alerta de Cheias do Amazonas de 2022 para anunciar a magnitude das cheias para Manaus. A terceira edição deve ser lançada no dia 31 de maio.

De acordo com a pesquisadora Luna Gripp, responsável pelo Sistema de Alerta Hidrológico do Amazonas (SAH), Manaus tem 98% de chances de atingir a cota de inundação severa e registrar até 29,80 metros, num intervalo provável de 29,30 a 30,30m. As chances de ultrapassar o recorde de 30,02 metros do ano anterior são de 30%.

Na sexta-feira (20), o nível do rio Negro registrou a cota de 29,32 metros.

(Phill Lima/Freelancer)

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