ARTIGO

Sem floresta e povos indígenas não têm clima

Juliana Radler
15/11/2022 às 16:54.
Atualizado em 15/11/2022 às 17:22

(Foto: ISA)

Os povos indígenas e tradicionais colaboram com a proteção de um terço das florestas no Brasil. Por habitarem tradicionalmente em territórios na floresta, vivem sem destruí-la e ainda a preservam através do seu modo de vida e cultura. Em todo o mundo, são os povos indígenas que protegem 80% da biodiversidade do planeta, segundo a ONU. 

A relação entre a preservação dos territórios indígenas, quilombolas e de outras populações tradicionais com o equilíbrio climático é fundamental. Sem terras indígenas demarcadas e protegidas não temos como avançar no combate às mudanças climáticas que ameaçam a nossa sobrevivência. 

Por isso, na Conferência da ONU para as Mudanças Climáticas, que está ocorrendo no Egito até o dia 18 de novembro (COP 27), é fundamental que as demandas destes povos sejam escutadas, respeitadas e atendidas. O Brasil está presente com uma delegação de quilombolas e indígenas que reivindicam maiores investimentos em ações de proteção territorial, reflorestamento, transição energética e redução de danos e impactos já causados pelo aquecimento global. 

Apesar dos dados que provam a força dos povos indígenas na preservação da sociobiodiversidade, essas populações tiveram acesso direto a apenas 0,13% dos recursos destinados à redução das mudanças climáticas entre 2011 e 2020. Essa situação precisa urgentemente ser superada. Investir para proteger as florestas que ainda estão intactas deve ser uma prioridade global. 

Durante a COP26 na Escócia, no ano passado, países do chamado “primeiro mundo” prometeram uma doação de US$ 1,7 bilhão para que os povos originários sigam protegendo seus territórios. Neste ano, um dos focos do movimento indígena é justamente cobrar o apoio financeiro prometido aos fundos geridos pelas comunidades indígenas.

Fundos Indígenas

Atualmente, organizações indígenas estão gerindo fundos próprios para investir em projetos que alavancam a economia da sociobiodiversidade e se voltam para a proteção das culturas e formas de vida integradas com a floresta. Um desses fundos é o Fundo Indígena do Rio Negro (FIRN), gerido pela Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), que em 2022 investiu R$ 1 milhão em projetos de associações indígenas das regiões de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira. São 1.711 indígenas de 22 povos envolvidos na implementação dessas ações, e a expectativa é que mais de 13,3 mil pessoas sejam beneficiadas por elas.

Um relatório da ONU mostra que, entre 2000 e 2012, as taxas de desmatamento na Amazônia do Brasil, Bolívia e Colômbia foram entre duas e três vezes menores dentro de Terras Indígenas quando se compara com as áreas ao redor. Essas áreas evitaram entre 42 e 59 milhões de toneladas de emissões de CO2 bruto na atmosfera. Seria como retirar de circulação cerca de 12 milhões de veículos por um ano. 

Portanto, quando investimos em projetos dos povos indígenas consequentemente investimos no combate às mudanças climáticas. Como disse o presidente norte americano Joe Biden ontem (sexta, 11/11), em seu discurso na COP, uma “boa política climática é também uma boa política econômica”. E completou: “A crise climática tem a ver com a segurança do ser humano, com a segurança econômica, a segurança ambiental, a segurança nacional e a vida do planeta". 

A expectativa no Egito é que sejam firmados compromissos por uma nova política socioambiental para o Brasil nos próximos quatro anos, já que, a COP também contará com a presença de membros do governo de transição e do novo presidente eleito. Há inclusive a chance de Lula anunciar a nova ministra do meio ambiente, cujo nome mais cotado é o da ex-senadora Marina Silva, que foi ministra da pasta no seu primeiro governo, entre 2003 e 2008, período marcado pela maior redução do desmatamento já registrada no Brasil. 

Além disso, um estande inédito formado por governadores amazônicos foi montado nesta COP para apresentar uma agenda próprias, diferente do estande oficial do atual governo federal. Os governos amazônicos têm como foco o desenvolvimento sustentável da floresta amazônica por meio de iniciativas de bioeconomia e do lançamento de um plano regional de combate ao desmatamento e às queimadas.

*Juliana Radler é jornalista com especialização em meio ambiente e analista de políticas socioambientais do Programa Rio Negro do Instituto Socioambiental (ISA)

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