Visual

Lenda de Honorato e Caninana e ritual Karõ Krahô são apostas do Garantido para a 1ª noite

Lenda possui 35 metros de frente, enquanto ritual tem 42 metros de boca de cena. Conceito estético das alegorias acompanham pesquisas feitas pelo DGE

Laynna Feitoza - De Parintins
laynnafeitoza@acritica.com
24/06/2022 às 16:51.
Atualizado em 24/06/2022 às 20:28

Parte da alegoria da lenda de Honorato e Caninana (Junio Matos)

As cobras irmãs Honorato e Caninana “descansavam” em um momento de trégua na concentração do lado vermelho do Bumbódromo de Parintins, a algumas horas do início do 55º Festival Folclórico de Parintins, que inicia nesta sexta (24). A lenda amazônica é a principal aposta alegórica do touro branco para edição do festival, e será apresentada no primeiro dia de apresentação, assim como o ritual Karõ Krahô, que também será o outro destaque visual da noite.

Ainda posicionados no chão, os módulos da alegoria que representavam as duas cobras, estavam posicionados frente a frente, com os braços de ambos fazendo uma espécie de “reverência” um ao outro, antes de começarem a batalha que cerca a lenda - uma das mais famosas da nossa região. 

As duas alegorias de ritual e lenda foram construídas em três meses. O conceito das alegorias é fruto da pesquisa da Direção Geral de Espetáculo (DGE) do Boi Garantido. A partir de uma sinopse criada por eles e entregue aos compositores e artistas de alegoria, tudo sai do papel e se materializa na arena.

A alegoria de Honorato e Caninana, assinada pelo artista plástico Neto Barbosa, possui 35 metros de frente e cinco módulos, além de ter o conceito técnico e robótico guardado a sete chaves pelos membros da DGE, para não comprometer o fator surpresa. 

Ainda conforme o artista, a alegoria em si não é gigantesca, mas a escultura, sim. “Com a luta das cobras irmãs, a que perde se regenera e vira uma cobra boa. A cunhã-poranga vai sair da escultura da Caninana”, coloca ele, lembrando que a alegoria também vem acompanhada de um cenário metade indígena e metade caboclo. 

De acordo com Mencius Melo, um dos compositores da toada “Quando Honorato Lutou Com Caninana” - que dá o molde sonoro da alegoria - afirma que o conceito da estrutura na arena é de embate. Mas a lenda será revisitada e adaptada para sensibilizar o público para uma das principais problemáticas da sociedade hoje: o feminicídio. 

“Os dois seres encantados são gigantescos e animalescos, e eles vão para um embate provocado pela letra da toada. Porque, conforme reza a lenda, os dois entraram em luta e Honorato matou Caninana, mas no conceito de revisitação que o Garantido faz nessa alegoria, Honorato não irá matar Caninana. Tupã irá intervir”, declara Mencius. 

Nesta adaptação, Honorato irá apenas apaziguar sua irmã Caninana, junto intervenção de Tupã. “E Tupã a transformará numa linda mulher, que é a cunhã-poranga. Com isso, o Garantido ressignifica a lenda e diz ‘não’ ao feminicídio, uma vez que Caninana é uma mulher”.

Com isso, o Garantido alegoricamente transforma Caninana, de um ser mal para um ser bom, para um ser feminino e belo, que é a cunhã, pontua Melo. “E assim a gente passa um recado ao mundo de que mulheres não podem ser mortas em nome de nenhuma bandeira”, finaliza.

O ritual

Alegoria do ritual Karõ Krahô (Junio Matos)

Outro grande momento alegórico do Boi Garantido a vir na primeira noite de festival é o ritual “Karõ Krahô”, também assinado pelo artista plástico Neto Barbosa, e que traz um resultado estético auspicioso e volumoso: ao todo, a alegoria traz 42 metros de boca de cena, o que, de acordo com Rubens Alves, membro do DGE do Garantido, nunca foi feito antes. A alegoria possui 15 módulos.

“O nosso diretor de galpão, Antônio Cansanção, que tem mais de 30 anos de experiência, chegou pra mim e disse que nunca montou uma estrutura tão grande. Estão montando estrutura de cenário, elas são abertas. A alegoria vai chegar muito próximo da galera, está no limite da arena”, pontua Alves, que também é um dos compositores da toada “Karõ Krahô – A batalha das almas”.

 De acordo com Neto, Karõ Krahô é o ceifador da morte, que julga as almas. O fundo do cenário, segundo ele, vai reproduzir uma espécie de inferno. “O pajé virá do alto como um anjo do bem”, pontua ele. 

Conforme Rubens, o ritual do Karõ Krahô vem do livro “Os Mortos e os Outros”, da escritora Manoela Carneiro. “O livro diz que, quando a pessoa não aceita a morte ou quando é muito jovem, e a alma não chega ao mundo espiritual, ela pode ser ‘entre aspas’ ressuscitada pelo pajé”, conta ele.

O projeto da alegoria traz uma questão de duelo entre bem e mal, viver e morrer. “E o que a gente vai ter de concepção, é que as tribos entram na alegoria com um corpo já desfalecido. E esse corpo vai ser elevado e, de cima da alegoria, o pajé vem de um guindaste na oca que vai ser aberta e ele desce. No céu, ele vai ter um encontro com essa alma”, pondera Rubens. 

No momento cênico, o pajé fará o resgate dessa alma, trazendo ela de volta, para fazer a sua ressurreição. O simbolismo da apresentação faz uma espécie de alusão às pessoas que foram acometidas pela Covid-19. “Aquelas pessoas que ficaram internadas, chegaram em estado de intubação e reviveram, voltaram à vida”, diz Alves. 

Na alegoria, predominam as cores na paleta de tons vermelhos, e apenas dois módulos possuem tons mais esverdeados, que são os módulos a representar os seres do bem. A figura do ceifador, que vem no módulo central trajando uma capa negra, representa a morte. 

“A morte é normalmente representada por um ser de capa negra. E muitas pessoas pensam que isso vem da Europa, e não é. Povos de todo o mundo representam a morte com uma capa negra. Se a gente fosse fazer uma comparação com a Covid-19, ela seria o próprio vírus, e no ato alegórico, ela será expulsa pelo pajé. A gente tem uma batalha do bem contra o mal, da vida contra a morte, e a vida no final vai vencer”, completa Alves. 

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