Violência

Brasileiro tem medo de ser agredido ao expor opinião política

Casos de agressões e até assassinato revelam a polarização política na pedida que o primeiro turno das eleições de aproxima

Waldick Junior
waldick@acritica.com
24/09/2022 às 10:58.
Atualizado em 24/09/2022 às 10:58

(Foto: Sérgio Moraes/Reuters)

Pesquisa Violência e Democracia divulgada neste mês aponta que mais da metade (67,5%) dos brasileiros teme ser vítima de agressões físicas ao expor escolhas políticas. O levantamento foi feito pelo Instituto Datafolha a pedido da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).  

O sentimento de medo não é em vão. Pelo menos 40 pessoas foram mortas em conflitos motivados por violência política somente neste ano, segundo o Observatório da Violência Política e Eleitoral da Universidade   Federal do Rio de Janeiro (Unirio).

Dois casos de grande repercussão tiveram como vítimas o tesoureiro do PT, Marcelo Arruda, assassinado enquanto comemorava o aniversário de 50 anos em julho; e o petista Benedito dos Santos, morto a facadas em Mato Grosso, neste mês. Em ambos os casos, os agressores eram bolsonaristas declarados.

Para o psicólogo José Trintin, o receio de violência política  nas eleições deste ano é funcional, ou seja, tem capacidade de expressar um acontecimento que pode vir a se tornar realidade. 

“Quando se tem um medo, é preciso analisar se é funcional ou disfuncional. No cenário em que vivemos, considero o medo de violência política um medo funcional, mas também depende da situação. Há certos locais em que a violência é mais provável de ocorrer, como locais de votação muito movimentados”, afirma.

Especialista

Trintin é especialista em terapia cognitiva comportamental (TCC),  abordagem terapêutica voltada para tratar pacientes a partir da maneira como reagem aos acontecimentos. Ele sugere que eleitores com muito medo reflitam sobre o que está causando aquele sentimento e aconselha que medidas sejam tomadas para dispersar o temor.

“Você precisa buscar o autocontrole ou buscar um profissional que possa te ajudar. Pode também tentar minimizar os riscos, como trocar a seção de votação e ir acompanhado com outras pessoas no dia do pleito”, sugere.

Cultura da violência 

Para o sociólogo e analista político Carlos Santiago, a violência observada no pleito deste ano reflete “uma cultura” presente em outros campos da sociedade brasileira. “Nosso país é muito violento, tem uma tradição que se traduz nos indicadores de agressões contra mulheres, negros, indígenas, idosos, indígenas, crianças e nos números crescentes de homicídios e de mortes no trânsito”, pontua.

Segundo ele, a crescente disputa política durante o processo eleitoral tem sido ‘intoxicada’ pela tradição de violência do país.

“Com essa polarização ideológica, de valores, e de grupos socioeconômicos, aumentam também as chances de conflitos e agressões. Agora, envolvendo apoiadores dos principais candidatos à presidência”, explica.  

Eleitores temem onda de violência

 Pesquisa ‘A Cara da Democracia’ divulgada neste mês aponta que mais da metade (54%) dos eleitores brasileiros teme uma onda de violência política no país em caso de vitória do candidato Luís Inácio Lula da Silva na corrida para a presidência, como mostram as principais pesquisas.

O temor é menor em caso de vitória do atual presidente, Jair Bolsonaro. Se reeleito, 40% dos eleitores têm receio de haver agressões ou revoltas motivadas pelo resultado do pleito.

Analistas políticos alertam para o incentivo à violência com a tentativa do presidente Jair Bolsonaro de atacar o processo de votação eletrônica, inclusive, ameaçando não aceitar o resultado das eleições, caso perca.

No último dia 18, o presidente disse em entrevista ao SBT que se não vencer no primeiro turno com mais de 60% dos votos, “algo de anormal aconteceu no TSE”. 

Em outras ocasiões, Bolsonaro também já disse que só vai respeitar o resultado das eleições se  forem “limpas e transparentes”, apesar de nunca terem sido registrados casos de fraude no processo de votação eletrônico brasileiro desde que passou a ser utilizado, em 1991.

Atenção redobrada para evitar onda de violência

 O temor de violência política no dia da votação fez o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançar na última quinta-feira  uma campanha em parceria com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). 

(Reprodução/Internet)

 A ação ‘Paz nas Eleições’ pede que a violência seja evitada na disputa eleitoral. Vídeos e spots estão sendo exibidos no rádio e na televisão. O anúncio seguirá até 2 de outubro.

Na terça, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, se encontrou com representantes das Polícias Civis de todos os estados do país para discutir a segurança no dia das eleições, incluindo protocolos para possíveis casos de insurgência. 

No Amazonas, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-AM), desembargador Jorge Lins, teve um encontro com o chefe do Comando Militar da Amazônia (CMA), general Achilles Furlan Neto, para alinhar a segurança dos locais de votação em conjunto com a Polícia Militar.

O Centro Integrado de Comando e Controle do Amazonas (SICC) , ligado ao Governo do Estado, também foi ativado para permitir a maior observação dos órgãos de segurança a possíveis casos de violência no período que antecede o pleito e no dia da votação.   

Eleitor com medo

A atenção expressada pela Justiça Eleitoral encontra eco na população. Uma pesquisa Datafolha divulgada neste mês aponta que quatro a cada dez brasileiros considera existir “grande possibilidade” de ocorrerem episódios de violência política no próximo dia 2 de outubro. O mesmo levantamento mostra que 9% admitem pensar em não ir votar no primeiro turno por receio de agressões.

Comentário

 José Trintin
Psicólogo

Pessoas mais intolerantes

A gente vem passando por um processo de mudanças sociais em que a intolerância acaba ganhando mais espaço. É um ‘não aceito a orientação sexual do outro, a opção política do outro, eu não aceito isso, não aceito aquilo’. 

Você percebe que a sociedade está mais intolerante porque as pessoas estão cada vez mais individualistas, utilizam menos a empatia. É como se estivéssemos passando por um processo de desumanização.

É preciso colocar na balança, que o eleitor se pergunte o que vale mais, a amizade que tem com o outro ou o próprio ideal político. Será que vale mais todo o nosso tempo juntos ou se você vota no Bolsonaro ou no Lula? É preciso ter consciência de que a sua escolha política não deve interferir na relação com alguém.

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