Novo presidente da Associação Amazonense de Municípios, prefeito Anderson Sousa critica gestão da Suframa e diz que as prefeituras preparam projeto para desenvolver a economia do interior do Amazonas
Anderson atuou como presidente da AAM entre 2005 e 2008 e agora volta ao cargo (Divulgação)
Aclamado presidente da Associação Amazonense de Municípios (AAM) no mês passado, o prefeito de Rio Preto da Eva, Anderson Sousa (UB), afirmou que a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) está “apagada”. Em entrevista para A CRÍTICA, ele falou sobre os desafios e projetos das prefeituras nos próximos anos, o que inclui a expansão dos setores da Zona Franca (indústria, comércio e agropecuária) para o interior do Amazonas.
Na conversa, Anderson falou ainda sobre a própria atuação durante a última campanha eleitoral, quando ele apoiou a reeleição do governador Wilson Lima (UB), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas declarou voto em Lula (PT), assim como também fizeram outros prefeitos. Na entrevista, ele também abordou Fundo Amazônia, desenvolvimento do interior, transparência das prefeituras e mais. Confira abaixo.
Qual o papel da associação na sua percepção e quais as prioridades desta gestão?
Já estamos discutindo vários temas no Amazonas que o governador pediu que conversássemos com o secretariado e, através da Secretaria de Governo, pudéssemos fazer tratativas que nos levassem a fazer acordos de cooperação técnica para que o município pudesse participar e de forma conjunta, atendendo a algumas necessidades. A primeira é discutirmos o projeto de saneamento básico. Estamos propondo uma parceria, um termo de cooperação para os municípios, junto com a Cosama e com a Secretaria de Planejamento, junto com o Ipaam, para podermos fazer esse planejamento e termos fontes de recurso para cobrir essas despesas por município. Outro tema prioritário é a questão das nossas dificuldades de geração de emprego e renda. Precisamos definir, em cada uma das nove regiões do Amazonas, as atividades a serem efetuadas. E para isso, é preciso reunir um grupo de gestores por meio de um termo de cooperação com a Sepror [Secretaria de Produção Rural], com a Federação das Indústrias do Amazonas, a Federação do Comércio, da Agricultura, para podermos criar, em cada município, uma identificação de emprego e renda. A Suframa precisa ser acionada, voltar a ser Suframa, porque, hoje, temos, infelizmente, uma Suframa apagada. Uma Suframa que não consegue nem reunir para fazer as PPB, os projetos de produtos básicos que as empresas oferecem para o Amazonas, porque tudo está cortado.
As prefeituras estão preocupadas com o reajuste do Piso do Magistério promovido pelo governo federal na semana passada. Dizem que o valor é impagável. A associação defende alguma solução que garanta valorização dos professores sem impactar tanto as prefeituras?
Não existe possibilidade nenhuma. A discussão da Confederação Nacional dos Municípios foi muito clara, decidindo entrar com uma medida cautelar para suspender a portaria [do reajuste], porque ela não pode ser maior do que a Lei. A decisão é do ministro de dar reajuste salarial e ele não aponta fontes de onde vai vir esse recurso. A lei é clara quando diz que um reajuste deve ir para o Congresso, para o Congresso votar e apresentar de onde vai vir a fonte para pagar. Senão, vamos ficar com esse processo de que os municípios precisam arcar com uma despesa que a União simplesmente criou, que jogou mais uma bomba para nós. Eu já somei, pedi para o RH fazer as somas, o meu contador. Só se eu mexer nos 30% [de repasse do Fundeb], ou seja, se eu acabar com transporte escolar, o que não tem como. Eu gasto R$ 800 mil de transporte escolar e quase todos os prefeitos gastam. Todos gastam para reformar uma escola, fazer os reparos, então, eu prefiro recurso em mãos, uma fonte diferenciada para pagar [esses outros gastos]. Os municípios não vão ter como arcar com essa despesa. Nós não temos fonte de receita. Eu sou professor, prezo por isso, o meu município é um dos três primeiros no Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica], agora não posso ter uma educação de qualidade querendo apenas pagar professor.
Na última eleição, o senhor apoiou a reeleição do governador Wilson Lima, aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, e vestiu a camisa, literalmente, do agora presidente Lula. Vale dizer que o senhor não foi o único prefeito nessa divisão. Como foi fazer esse apoio a políticos que não faziam parte do mesmo grupo na campanha?
A decisão é individual de cada município. Primeiro, porque não foi uma eleição municipal e cada prefeito não fez as coisas mediante ao CNPJ do candidato, mas sobre a sua responsabilidade, e cada um vai responder pelo que fez, eu, individualmente, posso ser chamado no Ministério Público e vou expor a minha opinião política. Eu posso apoiar qualquer candidato. E eu fiz a minha camisa [do Lula] e fui para a rua, pregando em todos os lugares. Apenas quatro municípios não deram vitória ao Lula. Temos aí o caso específico de Apuí, Boca do Acre, Guajará e Manaus. Agora em todos os outros municípios o Lula ganhou porque nós tivemos, no governo Lula, um tratamento mais leal em termo de merenda escolar, por exemplo. Quando o Lula saiu, o repasse para merenda era R$ 1. O Bolsonaro entrou e baixou para R$ 0,35. Quando o Lula terminou o mandato, nós tínhamos condições. Eu fui prefeito na época em que o Lula era presidente. Eu discuti com ele vários programas sociais. Foi quando começou o programa de creche. Fui para uma reunião representando a Associação dos Municípios, porque eu era presidente [da associação] naquela época. E o presidente nos ouviu. Tenho certeza que o Lula fará muito mais agora. Infelizmente, o presidente Bolsonaro não ouvia ninguém. A diferença é de quem ouvia e quem não ouve. O Bolsonaro nunca sentou com um sindicato, nunca discutiu com uma entidade de classe que pudesse levá-lo a fazer o melhor. Ele achava que era dono de tudo e isso fez com que ele perdesse uma eleição que era dele.
O Fundo Amazônia, um recurso internacional para o desenvolvimento da região, foi retomado no novo governo. Hoje, as principais entidades que recebem esse dinheiro são organizações da sociedade civil, as antigas 'ONGs'. O senhor defende maior participação das prefeituras?
Defendo que esse dinheiro vá para os municípios, porque, o que as ONGs estão fazendo no município? Não tem nada, uma atividade. Se você me apontar uma entidade que uma ONG fez dentro do município que possa levar um cidadão a se tornar um cidadão de qualidade, que tenha meios de vida, eu deixo de ser prefeito. Não tem uma ONG que eu conheça que prestou serviço a um município de maneira a fazer com que milhares de cidadãos fossem atendidos. A ONG pode atender uma meia dúzia de cidadãos, mas não atende a maioria. Quem atende? A prefeitura. Quando estão seiscentas, novecentas pessoas na fila... Eu tenho 19 mil pessoas cadastradas no CadÚnico. O que significa? É a linha de pobreza. São pessoas esperando para receber R$ 600 e agora mais R$ 150 por filho, o que vai fazer com que as pessoas fiquem em casa fazendo filho, porque vai ser a única alternativa, já que ninguém acha alternativa de trabalho, o que nós queremos mudar.
Os prefeitos estão numa luta atual para garantir o repasse do FTI – fundo estadual voltado para o desenvolvimento do interior – para a área da saúde, que está travado. Qual tem sido o posicionamento do Governo do Amazonas?
O FTI é uma lei criada para o desenvolvimento do interior. Infelizmente, com o passar do tempo, cada governador foi fazendo as suas mudanças. No período da Covid-19, o governador Wilson Lima designou parte deste recurso para o interior. O resto ficou em Manaus, mais para atender o Governo do Amazonas, na ocasião. No ano passado, nós não recebemos nada. Conversamos sobre esse assunto com o governador e como estava em período eleitoral, ficamos de, após a eleição, ver o básico para que ele pudesse nos passar. Dentro dessas tratativas que estamos tendo para a necessidade de investimento no interior [com as secretarias estaduais], vamos tratar do FTI, como ele pode ser aplicado e onde. É aquele acordo de cooperação que mencionei. Eu não sei qual foi o orçamento do governo estadual em cima do FTI, mas o fato é que vamos discutir isso.
Um levantamento do Ministério Público de Contas divulgado em 2021 mostrou que mais da metade dos municípios do interior tinha índices considerados críticos ou deficientes na transparência. Rio Preto da Eva, o seu município, estava classificado como deficiente. Por que os números baixos? A Associação pretende atuar nesse campo também?
O meu município é um dos quatro melhores na transparência. Eu não sei se existe alguma coisa irregular, mas, o que acontece... Foi criada uma estrutura aqui na Associação e se paga uma empresa para inserir os dados dos municípios. O problema é que essa empresa não estava fazendo isso ou não estava havendo comunicação do município com a empresa. Então, nós estamos atualizando isso. Tenho certeza que nesses próximos 60 dias nós iremos conseguir deixar o Portal da Transparência atualizado e termos os prefeitos, na sua maioria, alcançando a pontuação que de fato precisamos. O grande problema que sofremos é a internet. Estamos até discutindo isso. Estou fazendo um documento para o governador enviar para o ministro e ele ver de que forma pode mandar uma equipe para resolver, já que a maioria dos interiores estão deficientes em enviar essas informações.
O senhor mencionou anteriormente um projeto que está sendo pensado pelas prefeituras, industriários e governo. Qual a ideia?
Então, estamos fazendo um projeto, que é do governador, para implantar um distrito agroindustrial. Ele visa colocar indústrias na área de cosméticos e fármacos. Nós iremos aproveitar o que temos na natureza, já temos mais de 60 empresas cadastradas nesse projeto, e nós iremos fazer uma parceria com prefeitura, Suframa, Fieam, Faea, Sebrae e o governo para fecharmos esse projeto e iniciarmos a implementação nessa área, que é na entrada da cidade de Rio Preto. Nós temos a biodiversidade. É igual no Rio Solimões, onde se tem várias possibilidades com biodiversidade, mas não fazemos. O outro projeto maior é o do peixe. Qual a quantidade de peixe que vai toda semana para Bogotá? Cerca de dois aviões cargueiros só com peixe. E o que deixou de imposto? Nada. Pelo menos emprego deveria gerar, se colocássemos frigorífico, por exemplo. Então, esse é o nosso projeto.