Economia regional

Programa destina incentivos de empresas do Polo Industrial a novos negócios

Investimento obrigatório de empresas do Polo Industrial em P&D tem permitido o avanço de outra atividade, a bioeconomia

Waldick Junior
waldick@acritica.com
10/06/2023 às 08:30.
Atualizado em 10/06/2023 às 11:44

Casal formado por economista e técnica em química criou o Eurydice, o primeiro gin amazônico licenciado pelo Ministério da Agricultura para ser produzido no Amazonas (Divulgação)

Com a entrega do relatório sobre a Reforma Tributária à Câmara dos Deputados nesta semana, a discussão sobre complementos ou alternativas à Zona Franca de Manaus (ZFM) voltou à tona. Isso porque, no documento produzido pelo grupo de trabalho que analisou o tema, a manutenção da ZFM é citada como essencial para  a região Norte, enquanto se avança "na construção de um novo modelo".

Economistas discordam sobre se novas atividades possuem força suficiente para substituir por completo o Polo Industrial de Manaus, mas fato é que já existem negócios em andamento. Aliás, há exemplos que estão sendo impulsionados justamente por financiamento de empresas da ZFM. 

Fundada em 2020, a Da Cruz Destilados é a criadora do Eurydice, o primeiro gin artesanal produzido 100% no Amazonas. No ano passado, a produtora de bebidas se candidatou e foi selecionada para receber incentivos para diversificação do catálogo por meio do Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio), que já apoia 15 cadeias produtivas de atividades ligadas à bioeconomia, no Amazonas.

O projeto criado pela Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) capta investimentos de empresas do Polo Industrial e destina a negócios ligados à bioeconomia. A transferência é baseada na obrigatoriedade de empresas que recebem incentivos fiscais da ZFM de investirem em Pesquisa & Desenvolvimento na região, conforme a Lei de Informática. 

Incentivo

"É essencial esse tipo de apoio. Somos uma indústria de substituição, ou seja, as pessoas já utilizam esses produtos, as bebidas. Concorremos com multinacionais com dinheiro em bolsas, é desproporcional, então, sem incentivo, seria difícil conseguir se consolidar", afirma o economista e fundador da empresa, Daniel Cruz.


 
Com os incentivos por meio do PPBio, conta ele, o objetivo é diversificar o catálogo da companhia. Além do carro-chefe, o gin Eurydice, devem entrar no catálogo vodka, bebidas alcóolicas mistas, pré-mix para coquetéis e outros itens ainda em processo de licenciamento.

"No caso do Eurydice, do nosso custo para produção, 85% é gasto aqui na região. Substituimos várias matérias-primas tradicionais do gin, como o álcool de cereal, que é importado, pelo mesmo álcool utilizado para fazer xarope de guaraná, que é produzido em Maués, em Presidente Figueiredo", comenta o empresário.

O mesmo acontece com as laranjas e limões, utilizados para dar um gosto cítrico à bebida. "A gente vai na Banca da Japonesa, no Mercado Adolpho Lisboa, e compra ervas aromáticas e assim produzimos o nosso gin", conta.

O objetivo maior, ressalta Daniel, é criar uma cultura de consumo de bebidas produzidas na região, fortalecendo não somente o mercado, mas também enaltecendo recursos naturais da Amazônia.

"Ainda vemos que acontecem coisas bizarras, como um turista vir para cá, comer uma banda de tambaqui, mas tomar um vinho chileno ou um coquetel com whisky do Tenessi, porque nosso mercado é totalmente importado", comenta.

Mais de R$ 84 milhões já investidos

Instituído em 2019 pela Suframa, o Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio) já foi o intermediário para mais de R$ 84 milhões investidos em bioeconomia. O projeto é coordenado pelo Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (Idesam). Quem explica é o gestor do programa, Paulo Simonetti.  
  

“A Suframa concede incentivos para as indústrias que estão aqui. Por sua vez, essas empresas têm várias contrapartidas. Uma delas, é que precisam investir parte do faturamento anual em Pesquisa & Desenvolvimento. Elas têm uma lista de onde podem investir, e uma das opções é o PPBio”, afirma.

Atualmente, estão sendo executados 24 projetos por meio do programa. Além disso, outros 14 já foram finalizados e há ainda mais de 400 cadastrados.

“A pessoa interessada em receber um recurso pode entrar em contato conosco. Se cumprir os requisitos, ajudamos a formular um projeto e eu vou pessoalmente às indústrias, bater de porta em porta para apresentar os projetos de acordo com a demanda dos investidores”, explica Simonetti.

Conforme os projetos atualmente disponíveis para investimento no site do PPBio, os aportes vão desde R$ 500 mil a R$ 3 milhões. Os negócios variam de produtos amazônicos a projetos de turismo.

'Como a gente pode destravar isso?'

Para a diretora-executiva do Idesam, Paola Bleicker, além dos incentivos, uma das maneiras de oferecer suporte a  projetos ligados à bioeconomia é consumir mais produtos com origem certificada da região.  

“Muita gente pergunta ‘o que posso fazer pela Amazônia?’ e podemos começar por ações simples, como o consumo. Por que não pensar um consumo que leve em consideração um produto da região com valor agregado?”, comenta.

O Idesam é a organização social que coordena o PPBio. Para Bleicker, a bioeconomia é o caminho para manter a floresta em pé e gerar renda para toda a cadeia do produto.
 

“O Idesam já é pioneiro nisso há 20 anos, no Amazonas. A gente sempre tem esse propósito de pensar numa economia de base inclusiva, sustentável, sabendo que a floresta vale muito mais a pena em pé do que derrubada”, pontua.

Saiba mais

Ecológico 

A técnica em química Fabíola Benarrós, que assina a fórmula do gin, diz que a produção é 100% ecológica. “A produção de bebidas tem esse problema de contaminação do lençol freático, mas tivemos essa preocupação desde o início. Não geramos resíduos e nosso álcool, o que fica, transformamos em álcool 70%”.

Blog

Michele Lins

Economista e doutora em Desenvolvimento Regional

“Não existe nenhum outro modelo   que pode gerar o quantitativo de empregos diretos e indiretos se comparado ao que temos no modelo Zona Franca de Manaus. Nem mesmo a bioeconomia, a psicultura ou o turismo têm condições de gerar a quantidade de empregos que geramos. Sempre digo que todo e qualquer modelo que seja apresentado como alternativa tem de ser complementar à Zona Franca. Por isso, ela precisa ser preservada e fortalecida. A bioeconomia constitui uma relevante oportunidade para agregar valor aos produtos da floresta, servindo para fomentar a economia regional e preservar a biodiversidade. O que precisamos é desenvolver uma atividade econômica com alto valor agregado, por exemplo, deixar de exportar a polpa do açaí e fazer o uso do produto em processos produtivos industriais, como na indústria da beleza”. 
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