Sem crise e sem preconceito

Jovens empreendedores apostam na diversidade e em estabelecimentos inclusivos em Manaus

Cabeleireiros estão otimistas com a recuperação da economia brasileira e quebram padrões em seus salões de beleza.

Luana Carvalho
luanacarvalho@acritica.com
29/05/2023 às 16:15.
Atualizado em 29/05/2023 às 16:25

A iniciativa de ter uma equipe totalmente LGBTQI+ surgiu após um episódio de homofobia que Matheus vivenciou no passado. (Jeiza Russo/AC)

Pesquisa Pulso dos Pequenos Negócios, realizada pelo Sebrae e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que o setor de beleza é um dos mais otimistas com a recuperação da economia brasileira em 2023. O empreendedor Matheus Santiago (@matheusdoscachos_), 23, especializado em cabelos cacheados, faz parte dos 75% de empresários que acreditam que o faturamento deste ano será maior que em 2022.

O segmento foi um dos mais afetados durante a pandemia de Covid-19, especialmente nos períodos de ‘lockdown’. E foi após o ápice da pandemia, mas ainda num momento difícil para todos os brasileiros, que o empreendedor, hoje conhecido como ‘Matheus dos Cachos’, deu o pontapé inicial.

“O Matheus dos Cachos surgiu sem querer num momento de sobrevivência. Atendia em um salão para cabelos cacheados como maquiador e lá aprendi a cortar cabelo. Fui demitido na pandemia e não tinha o que comer. Não tinha emprego, shoppings fechados. Então tive a ideia de começar a atender os clientes na casa da minha tia, com todos os equipamentos de proteção. Eu só tinha um pote de creme, uma escova, um secador e uma tesoura. E foi quando tudo aconteceu”, relembra.

Depois de fazer sucesso atendendo na sala da tia, ele montou seu próprio salão. (Jeiza Russo/AC)

Matheus não esperava que o seu trabalho fosse ser reconhecido em tão pouco tempo, mas o sucesso veio, e por meio de recomendações ‘boca a boca’. Quando os estabelecimentos voltaram a funcionar de forma gradativa, ele percebeu que a pequena sala na casa da tia não comportava mais o número de clientes que ele atendia. Foi aí que ele decidiu abrir o próprio salão, maior e com o estilo dele.

Inclusão

Hoje, Matheus possui um estabelecimento no centro da cidade, com 10 funcionários, todos LGBTQI+. “No meu negócio, decidi que daria aos clientes um atendimento personalizado, focado na experiência e acolhimento de cada cliente. O salão conta com uma decoração instagramável, produtos veganos, além de oferecemos cerveja e capuccino de cortesia para nossos clientes”, conta.

Matheus montou uma equipe  totalmente LGBTQI+. (Jeiza Russo/AC)

A iniciativa de ter uma equipe totalmente LGBTQI+ surgiu após um episódio de homofobia que Matheus vivenciou no passado, ao chegar de mãos dadas com o namorado em uma barbearia.

“Logo em seguida, uma amiga minha lésbica pediu para eu acompanhá-la numa barbearia porque ela também tinha medo de sofrer discriminação. Então notei que esse temor é muito recorrente na comunidade LGBTQIA+. Ter um espaço em que possamos ser incluídos pela forma que realmente somos, não tem preço. Nosso estúdio não é exclusivo pra comunidade, mas é inclusivo. Então também temos clientes heterossexuais”, reforça.

Além de um salão de beleza, o estabelecimento, para Matheus, é um espaço sem brechas para o preconceito. Na parede, há uma placa dizendo que machistas, homofóbicos e racistas não são bem vindos. “Meu negócio também é um local de fuga nesse meio de tanta discriminação.A dica que eu dou pra quem quer empreender é fazer o diferente, por mais que no começo pareça estranho, ser igual a todos não tem graça”.

Fada das cores de Manaus

Virna Jesus de Souza, a ‘Fada das Cores’ (@virna_hair), também é empreendedora da área de beleza. Aos 22 anos, ela conta que enfrentou dificuldade para empreender.

“Os fornecedores não acreditavam que eu já tinha um salão e que eu fosse pagar meus boletos em dia. Foi difícil encontrar um representante que acreditasse em mim, principalmente por se tratar de cabelos coloridos. Muitas pessoas acham que só adolescentes gostam de colorir os cabelos”.

Virna escolheu trabalhar com cabelo colorido por ser uma área que possui muita demanda. (Junio Matos/AC)

A jovem, que fez seu primeiro curso na área aos 13 anos, provou o contrário. Assim como Matheus, em 2020 ela também foi demitida do salão de beleza que trabalhava por conta da pandemia, mas levou consigo toda a experiência adquirida no antigo local de trabalho.

“Fiquei muito triste mas para mim foi o recomeço. Comecei a fazer curso online sobre cabelos coloridos e fiquei atendendo em domicílio. Depois passei a trabalhar com uma pessoa que fazia cabelos coloridos em Manaus. Trabalhei com ela quase um ano, mas ela não me pagava. Pedi demissão e tive que começar novamente, somente com um espelho, uma cadeira hidráulica e um lavatório. Desta vez, inciei meu próprio negócio”, relembra.

A jovem escolheu trabalhar com cabelo colorido por ser uma área que possui muita demanda mas poucos profissionais especializados. “Hoje eu atendo pessoas de todas as idades. Não existe um padrão de pessoa para se ter o cabelo colorido. E no meu salão procuro deixar todos à vontade. Não ligo para que roupa a cliente vem, quanto dinheiro ela tem. Minhas clientes são, sobretudo, amigas”, reforça.

Na média, a pesquisa do Sebrae e IBGE identificou que 67% dos pequenos negócios esperam um faturamento melhor neste ano, em comparação com 2022. Apenas 19% dos empresários esperam um ano pior e outros 14% acreditam que devem manter o mesmo resultado do ano passado.

A jovem, de 22 anos, fez seu primeiro curso na área de beleza aos 13 anos. (Junio Matos/AC)

Mesmo com a pouca idade, Virna possui dinheiro em caixa para qualquer imprevisto, ainda que a crise, para ela, não exista. “As mulheres não deixam de fazer o cabelo. Faça chuva ou faça sol, elas sempre vem retocar, principalmente os coloridos. A dica que dou, para quem quer empreender na área, é ser firme e acreditar em si. E claro, guardar dinheiro”.

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